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RESILIÊNCIA E TRABALHO

Reflexões sob a Perspectiva da Psicologia Analítica com Abordagem Corporal

Introdução

O conceito de organização pode ser compreendido como qualquer empreendimento humano, constituído e estruturado em prol de um determinado objetivo. Por ser constituída por pessoas, a organização é considerada uma entidade social. E se torna estruturada a partir do momento em que o trabalho passa a ser dividido entre seus membros e os resultados alcançados, atribuídos a esses profissionais (Chiavenato, 1999 apud TEIXEIRA E QUEIROZ, 2013).

Em meados da década de 60, a estrutura e o funcionamento das organizações passaram a dar mais importância ao comportamento das pessoas enquanto grupo e indivíduos, por entender que a qualidade do trabalho depende da motivação e comprometimento da equipe com a empresa. No entanto, o cenário mundial atual, caracterizado por rápidas e frequentes transformações tecnológicas e econômicas, fez com que as empresas começassem a adotar um
funcionamento de constante reestruturação para manter sua sustentabilidade e competitividade no mercado.

Nesse sentido, há uma forte demanda de estrutura e flexibilidade de ação, como forma de adaptação às novas condições sociais, culturais, políticas, econômicas e tecnológicas. Essa realidade tem interferência direta na identidade do profissional, uma vez que o sentido e valor
que atribui às referências ao seu redor estão em constante alteração. Assim, o indivíduo precisa aprender a conhecer sua própria identidade para se ajustar ao meio em que está inserido e conseguir estabelecer vínculo com o trabalho e atender às exigências do mercado (BARLACH et al, 2008). Com isso, os desafios aumentaram e os profissionais passaram a serem mais cobrados para gerarem maior produtividade com menos recursos.

Diante desse cenário, o conceito de resiliência, considerado a “capacidade de superar e adaptar-se a uma dificuldade, desenvolvendo recursos para construir novos caminhos de vida
e enfrentar situações estressantes e/ou traumáticas”(TEIXEIRA E QUEIROZ, 2013), passou a ser estudado pelas empresas, sobretudo pela área de gestão de pessoas, que identificou na resiliência uma competência necessária para o desempenho constante de seus recursos humanos. Isto posto, o objetivo desse artigo é refletir sobre a importância do desenvolvimento da resiliência no ambiente corporativo e como o trabalho corporal pode auxiliar nesse processo.

Segundo Safra (2004 apud BARRETO, 2011), o desenvolvimento da resiliência inclui o despertar da corporeidade e a necessidade de ancorar a natureza mais profunda do indivíduo, uma vez que somente um indivíduo resiliente pode construir uma organização resiliente.

Para VILELA DA MATTA (2016), uma organização resiliente é capaz de sustentar sua vantagem competitiva mesmo em tempos difíceis e sob alta pressão. Essa vantagem competitiva, citada por ele, é formada por três habilidades:

  1. Otimismo: capacidade de manter uma performance elevada e consistente em relação aos objetivos estabelecidos;
  2. Flexibilidade mental: capacidade de inovar;
  3. Proatividade: a capacidade de adaptar-se de modo rápido e eficaz aos novos desafios, sem perder sua identidade.

Esse tema é pouco estudado na ciência e na psicologia analítica, principalmente quando se remete ao trabalho corporal como ferramenta de desenvolvimento de resiliência. Nesse sentido, a intenção desse estudo é contribuir para uma nova visão científica sobre um tema tão importante e relevante na atualidade, possibilitando novos conhecimentos e contribuindo para uma nova cultura organizacional, com olhar mais humanizado para seus colaboradores, identificando suas potencialidades e desenvolvendo os profissionais para se tornarem mais conscientes, confiantes, motivados, resilientes para lidar com as adversidades e satisfeito em
seus ofícios.

Efeito da Globalização nas Organizações

No final do século XX o sistema capitalista sofreu grandes transformações, que não impactaram no seu modo de produção, mas sim reforçaram e acentuaram sua característica mundial. O novo nome para o processo de internacionalização passa a ser globalização, e nasce com o capitalismo. Isso ocorreu devido ao fato de as empresas multinacionais terem mais agilidade no mercado mundial do que as empresas nacionais. Dessa forma, as leis inerentes ao modo de produção capitalista despontam com intensidade, motivando a comercialização e a financeirização de todas as relações econômicas (GORENDER, 1997).

A revolução tecnológica, especialmente a informática e as telecomunicações, possui grande influência nas transformações do sistema capitalista mundial. Os efeitos podem ser observados
na forma de as empresas se organizarem, nos métodos de produção adotados, nas relações de trabalho e na política. Esse processo teve início com a mudança do regime fordista para o de produção enxuta (idem).

No inicio do século XX, Henry Ford introduziu métodos de trabalho em sua fábrica, transformando a produção artesanal em produção em massa, o que acarretou o aumento do volume da produção e do valor agregado ao produto. Esse regime tornou a indústria automobilística a de maior peso mundial (idem).

Esse método de trabalho surgiu em concordância com a organização cientifica do trabalho, proposta por Frederick Taylor, que objetivava diminuir o tempo ocioso no processo de trabalho e aumentar o volume de produção a custos baixos. Assim surgiu, nos Estados Unidos, o regime fordista-taylorista, considerado à época a resolução dos problemas econômicos (idem).

Esse regime propunha um padrão de conduta dos trabalhadores, sendo um dos princípios básicos a separação do trabalho intelectual (diretores e gerentes) do manual (operários). Dessa forma, os trabalhadores de chão de fábrica foram estimulados a não pensar, devendo manterse concentrados nas tarefas manuais, que deveriam seguir normas rígidas de movimentos, buscando economizar ao máximo o tempo, enquanto a atividade de pensar era restrita aos
seus superiores. As peças, componentes e produtos foram padronizados em uma esteira de montagem, e assim a produção foi parcelada em etapas numa repetição rotineira infinita. A padronização refletiu-se no baixo nível de qualificação dos trabalhadores, assim como na qualidade e preço baixo dos produtos (Womack et al, 1992 apud GORENDER, 1997). Para Dal Rosso (apud COSTA, 2010), o interesse em aumentar a produção acarreta o aumento de horas de trabalho, gerando uma crescente intensidade da jornada de trabalho.

Diante desse cenário e da realidade desses trabalhadores pós surgimento do capitalismo, é possível fazer um paralelo com o mito de Sísifo, que foi punido por desafiar os deuses e por isso condenado a levar uma pedra gigante até o topo da montanha, de onde ela rolaria para baixo e ele então precisaria começar novamente a empurrá-la. E embora não identificasse sentido naquilo, ele continuou executando sua tarefa diariamente, em um trabalho rotineiro e cansativo (CHAVES et al, 2017).

Em 1941, o filósofo francês Albert Camus (apud CHAVES et al, 2017) fez referência ao mito para explicar a vida humana, que segue uma rotina diária sem atribuir sentido próprio, sendo que as pessoas levantam pela manhã, trabalham, come, reproduz e no dia seguinte
repetem a mesma sequência. O autor não enxerga sentido nisso, pois entende que são formas de pensar e agir impostas ao indivíduo, que não participa ou escolhe seu modo de vida, que em sua maioria é determinada pela religião ou pelo sistema capitalista (CHAVES et al, 2017).

Mais tarde, os capitalistas e os operários se dão conta do mal acarretado pelo aumento de horas de trabalho e começam a investir em tecnologia, mas ainda assim os trabalhadores são exigidos a se adaptar ao novo sistema de trabalho, que surge ainda mais acelerado e intensificado. Com o quadro de desgaste dos trabalhadores, inicia a luta dos operários por uma jornada mais justa de trabalho, reivindicando tempo de descanso. Essa relação empregado X empregador nasce com conflitos de interesse: de um lado, o empregador focado no aumento da produção e lucratividade; de outro, os trabalhadores exaustos com a intensidade de trabalho e lutando por descanso (COSTA, 2010).

O tempo livre, o tempo de não trabalho, passa a ser engolido pelo trabalho. A tecnologia que poupa trabalho está falhando em liberar aqueles que trabalham (Dal Rosso, 2008, p.71 apud COSTA, 2010).

O pensador alemão Karl Marx (apud CHAVES et al, 2017) sonhou que um dia a tecnologia faria com que o indivíduo conseguisse trabalhar apenas quatro horas do dia e as restantes fossem utilizadas para seu lazer. Acreditava no conceito de alienação no trabalho, desenvolvido por Hegel, que significava a falta de compreensão do trabalhador sobre aquilo que produzia, sem ter participação no destino de suas ações.

Durante muitos anos foi assim a relação do trabalhador com seu trabalho, sem grandes questionamentos e sentido. Era a moeda de troca para obtenção dos bens desejados e sobrevivência no mundo capitalista. Não existiam boas condições de trabalho e este sempre
foi considerado um exercício penoso, árduo e infeliz. As melhores condições existiam para aqueles que tinham mais posses e conseguiam abrir seu próprio negócio ou estudar as únicas profissões da época: medicina, direito, engenharia (CHAVES et al, 2017).

Com o passar do tempo, as condições e oportunidades de trabalho foram melhorando, as opções de profissão cresceram em alta velocidade e ainda que não sejam o ideal, não se resumem mais em escravidão ou trabalho alienado (idem).

O ser humano segue precisando se adaptar à intensidade, e se antes esta era em relação à carga horária de trabalho, hoje, no século XXI, é em relação às mudanças que acontecem de forma tão rápida, que são difíceis de serem acompanhadas. Chaves (idem) faz uma analogia
com alguém que, se dormisse no ano de 1100 e acordasse em 1300, não teria tanta dificuldade em reconhecer o mundo, ao contrário de alguém que, se dormisse em 1980 e despertasse em 2018, não conseguiria se comunicar com o mundo de hoje, “ouviria: me passa um WhatsApp e não saberia o que fazer” (p. 3).

Diante deste cenário, o dilema atual do indivíduo está relacionado à necessidade de realização pessoal X profissional. E, ao mesmo tempo em que há inúmeras possibilidades de escolha, há também muitas limitações. Conciliar as necessidades pessoais, que para muitos
ainda são desconhecidas, com as exigências do mercado e os propósitos das organizações é algo desafiador, desgastante e desestimulante para uma boa parcela dos profissionais, que precisam se reinventar a cada instante e se equilibrar diante de tantas informações e estímulos tecnológicos, afetando também a relação empregado–empregador, uma vez que o trabalho em massa e a ausência de reflexão não constituem mais o profissional contemporâneo, que busca sentido no trabalho e aliar seu propósito de vida com o da organização (CHAVES et al, 2017).

As exigências do mundo moderno trouxeram inúmeros questionamentos para o indivíduo, afetando seu estado emocional e físico.

Estresse e Trabalho

Em 1936, o médico endocrinologista Hans Selye foi o primeiro a tentar definir o estresse, considerando parte de toda doença que provoca mudanças na estrutura e composição química do corpo, sendo passível de observação e mensuração. Para ele, o estresse manifestava-se através da Síndrome Geral da Adaptação, caracterizada pela dilatação do córtex da suprarrenal, atrofia dos órgãos linfáticos e úlceras gastrointestinais, além de perda de peso. Essa síndrome era dividida em três fases: a primeira, considerada a fase de alarme, devido às manifestações agudas; a segunda, de resistência, com o desaparecimento das manifestações agudas; e a
terceira, a exaustão, quando os sintomas da primeira fase retornam, podendo causar colapso no organismo. O autor ressalta que o estresse pode ser encontrado em todas as fases, mas que não necessariamente todas precisam ser desenvolvidas para que haja a síndrome (FIGUEIRA E HIPPERT, 1999).

Em 1992, os brasileiros Júlio de Mello Filho e Mauro Diniz Moreira começaram a discutir a relevância do estado emocional dos pacientes com doenças infecciosas. Para eles, os estresses físico, psicológico e social são reações que afetam o equilíbrio do organismo, causando
danos. Em uma visão biopsicossocial, o estresse pode derivar do meio externo em função de estímulos de ordem física e social, como por exemplo o trabalho, ou do meio interno, pelos pensamentos, emoções, sentimentos e fantasias. Desde então, o conceito de estresse tornouse popular e tem sido amplamente utilizado na atualidade, considerado o responsável pelos males da sociedade, em decorrência da vida moderna (idem).

Uma pesquisa realizada pela ISMA (International Stress Management Association), em 2012, revelou que os trabalhadores brasileiros estão entre os mais estressados do mundo e que o Brasil é o segundo país com maior índice de Síndrome de Burnout, ficando atrás apenas do
Japão. O termo burnout na língua inglesa significa aquilo que parou de funcionar devido ao esgotamento da energia. Os que possuem esse tipo de estresse apresentam um esgotamento físico e emocional que os levam a agir com irritabilidade e agressividade (Teodoro, 2012).

Uma nova pesquisa realizada em 2015 pela mesma associação (ISMA) mostra dados alarmantes sobre a realidade dos profissionais brasileiros, revelando que nove a cada dez profissionais apresentam algum grau de ansiedade, que varia do mais leve ao incapacitante, e
47% dessa população possui depressão. Doenças mentais e emocionais são a segunda causa de afastamento das empresas. Mais de 60% dos brasileiros relacionam o estresse ao trabalho,
e como o principal desencadeador de nervosismo, irritabilidade, tristeza e queda de energia. 30% sofrem da Síndrome de Burnout e apresentam os sintomas de dor de cabeça, dores musculares, problemas digestivos, distúrbio do humor, falta de concentração e problemas com o sono. A Organização Mundial da Saúde fez um alerta recentemente de que uma a cada quatro pessoas sofrerá de algum transtorno mental ao longo da vida. E apesar dos números
assustadores, ainda são poucas empresas que promovem assistência psicológica aos seus colaboradores (SENDIN, 2016).

Esses fatores são influenciados pela evolução tecnológica vivenciada nos últimos anos, atrelados à hiperconectividade, fazendo com que as pessoas recebam inúmeras informações instantâneas e simultaneamente, em forma de e-mails, aplicativos e alertas de compromissos, entre outras. Segundo a neurocientista da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, Carla Tieppo (2016 apud SENDIN, 2016), a informática fez com que as pessoas
tivessem mais controle sobre suas vidas, mas isso implicou em uma maior carga cerebral.

Diante disso, as pessoas são lembradas constantemente das responsabilidades não realizadas ou concluídas. Como esse cenário ainda é novo, a habilidade emocional para lidar com essa nova era ainda não foi desenvolvida por completo pelas pessoas, e por isso acarretam aumento de estresse, ansiedade e transtorno de humor (SENDIN, 2016).

Os problemas de ordem emocional e psicológica ainda são um tabu na sociedade e sobretudo nas organizações, que não incluem em suas pautas questões relacionadas às condições e ritmo de trabalho, lazer, estresse e qualidade de vida. Mesmo diante das mudanças nas relações entre as empresas e seus colaboradores, a produtividade e o foco em resultados continuam sendo mais importantes que a saúde dos profissionais (idem).

Resiliência

Em inglês, a palavra resiliência (resilience) refere-se à elasticidade de materiais e é aplicada na engenharia. Entretanto, o conceito de resiliência é encontrado em diversas áreas de conhecimento, como na literatura, mitologia, história, arte, religião, e finalmente, na psicologia, que procura compreender o funcionamento do indivíduo em eventos estressores, adversos e até mesmo traumáticos.

Em um ambiente organizacional, a mudança frequente de objetivos, aumentos na cobrança por resultados e alta-performance podem ser altamente estressores e desestruturantes para o profissional. Dessa forma, surge a pergunta: Como essas pessoas sobrevivem a esse ambiente competitivo? Como essas pessoas são capazes de se manterem produtivas e superam essas adversidades?

A resposta está na resiliência, definida por ARAÚJO (2011, p. 12) “como a capacidade latente para se curar e sobrepor-se à adversidade”. E acrescenta: “pessoas dotadas dessa capacidade
podem ser abatidas pelas vicissitudes da vida, mas retomam sua integridade, podendo se tornar mais fortes e mais resistentes ainda”.

Diante disso, é importante fazer a distinção entre resistência e resiliência. A ecologia define resistência como a “capacidade de um sistema suportar variações quando submetido a uma alteração ambiental” (GUNDERSON, 2000, p. 51). Em um exemplo prático, trata-se de plantas capazes de sobreviver em temperaturas extremas. Mas como isso se aplica à psicologia? Uma pessoa resistente é capaz de suportar situações extremas valendo-se de mecanismos de defesa;
trata-se de alguém que não se transforma a partir da adversidade, mas apenas “aguenta” a situação que está sendo vivenciada. Vale ressaltar que existem momentos na vida em que é muito sofrido
vivenciar de fato os infortúnios que podem assolar a pessoa, e dessa forma é necessário resistir e se defender diante de situações potencialmente traumáticas. No entanto, se a pessoa viver apenas
resistindo por um longo período, existem grandes chances de adoecimento.

LIPOWSKI (1988) apropriou-se do termo grego soma, e cunhou o conceito de somatização, que consiste em “uma tendência para experimentar e comunicar desconforto somático e sintomas que não podem ser explicados pelos achados patológicos, atribuí-los a doenças físicas e procurar ajuda médica para eles”, ou seja, trata-se de um corpo que adoece sem uma razão médica. Nesta situação é comum a pessoa apenas resistir a tudo, sem se deixar tocar pela dor emocional.

Em contrapartida, a resiliência na ecologia é considerada a “capacidade de um sistema retornar à sua condição inicial após uma modificação” (GUNDERSON, 2000, p. 52). Dessa forma, uma pessoa resiliente é capaz de “ressignificar o evento adverso que causou o desequilíbrio, considerando-o como uma possibilidade de desenvolvimento, individuação e uma oportunidade de fortalecer o vínculo com a vida” (ARAÚJO 2011, p. 12).

Seria então a resiliência um dom, um talento ou um potencial? ARAÚJO (2011) afirma que:

Resiliência é um potencial, presente nos seres humanos, em todas as culturas e em todos os tempos, que se atualiza sob formas diferentes, dependendo da cultura, da sociedade e da época e é um mito que se constela frente às vicissitudes da vida, para gerar crescimento (p. 11).

Assim, é possível entender que todos têm a capacidade de ser resilientes, desde que consigam enfrentar as situações adversas na vida (idem).

Resiliência nas Organizações

No ambiente organizacional, a resiliência serve como um recurso adaptativo, que contribui para uma relação saudável entre a empresa e seus colaboradores. Coutu (2002 apud BARLACH et al, 2008) descreve três características de uma organização ou pessoa resiliente, sendo a primeira a aceitação da realidade, a segunda os valores e crenças sobre o significado da vida, e a terceira a habilidade do improviso.

O autor JOB (2003) apresentou os fatores de riscos, considerados geradores de sofrimento no ambiente de corporativo, destacando a pressão e responsabilidade no trabalho, intolerância à frustração, a falta de tempo na vida pessoal e familiar, falta de reconhecimento e apoio dos pares e gestores, e falta de controle sobre o futuro. Por outro lado, referindo-se à resiliência, destacou como fatores de proteção: a autoestima, autonomia, autodeterminação, respeito,
reconhecimento, apoio familiar, amigos, entre outros sentimentos. Em pesquisa realizada com profissionais do setor de eletroeletrônicos, Job percebeu que o sentido que os profissionais
atribuíam a seus trabalhos estava relacionado à percepção que desenvolviam de si próprio, e isso gerava pressão interna maior do que a pressão externa do ambiente de trabalho. Além disso, identificou que a falta de tempo para a família, dificuldade em lidar com as próprias falhas e a falta de controle sobre seu futuro agiam com fonte de sofrimento.

Em outros estudos que relacionam a resiliência com o sofrimento criativo, que nada mais é que o aumento da resistência diante do risco de um colapso psíquico, indica que a resiliência surge a partir de eventos adversos e que o enfrentamento dessas situações fortalece a psique do indivíduo, proporcionando ganhos à saúde mental (BARLACH et al, 2008).

Diante disso, a dinâmica de trabalho nas organizações contemporâneas passou a desejar a resiliência como competência, devido à sua capacidade de flexibilizar, entendendo que o
sujeito resiliente consegue administrar sua subjetividade em momentos de tensão e pressão inerentes ao contexto profissional (idem).

Resiliência e o Processo de Individuação

Para a psicologia, resiliência é a capacidade de o indivíduo de buscar novos significados para as experiências vivenciadas. Todas as pessoas são dotadas de forças transformadoras, que diante, de uma adversidade, pode se entregar ao evento traumático ou, despertar seu herói adormecido, e ressignificar a experiência (PALUDO, 2005).

O herói é a expressão do arquétipo que desperta em momentos difíceis e tempestuosos. É a metáfora do ser resiliente, que aceita os desafios da vida. Começa sua jornada saindo de um lugar conhecido, interno e externo, em busca de algo novo e maior, enfrentando e superando as adversidades. Nesse processo, o herói desce na escuridão da psique e precisa fazer renúncias e sacríficos, mas quando retorna ao ponto de origem, está transformado. CAMPBELL (1992) acredita que sempre que o sujeito sai do lugar onde se sente inteiro, em busca do chamado da alma, está seguindo o caminho dos heróis.

Para Jung, a aproximação ao arquétipo do herói é um aspecto do processo de individuação, em que o indivíduo busca se tornar integrado, único e indiviso (STEIN, 2006). Jung acreditava
que o relacionamento entre consciente e inconsciente era fundamental para saúde psíquica, e essa relação se dava entre o complexo individual do eu e o arquétipo do Si-Mesmo – de totalidade e inteireza. A partir da consciência da existência do relacionamento contínuo, consciente e inconsciente, entre o eu e Si-Mesmo, o sujeito constrói um senso de individualidade única,
conecta-se a uma experiência mais ampla da existência humana e se torna capaz de viver de modo criativo, simbólico e individual. Ele ainda acreditava que a verdadeira vida humana estava na união dos opostos dentro da alma, tornando o sujeito hábil em formar uma personalidade individual, coerente e singular, mas com profundidade e riqueza (HOPCKE, 2011).

Nesse sentido, o conceito de resiliência atua em concordância com o processo de individuação desenvolvido por Jung, uma vez que quando o indivíduo consegue integrar determinado conteúdo e alcançar o equilíbrio psíquico, ele se torna mais fortalecido e preparado para superar a adversidade e se transformar positivamente diante dela, em um processo permanente de enfrentamento e tentativa de superação de obstáculos.

Trabalho Corporal no Desenvolvimento da Resiliência

Como citado anteriormente nesse artigo, os efeitos decorrentes de eventos estressores se manifestam como sintomas emocionais, tais como desanimo, angústias, medos, tristeza, agressividade, irritabilidade, entre outas emoções e sensações. E se manifestam também por sintomas físicos, como dores diversas (cefaleias e dores musculares), distúrbio gastrointestinal, cansaço, alterações do sono, do apetite, da memória, da concentração e até mesmo da imagem corporal.

Isso significa que não se deve tratar a psique e o corpo de forma separadas. É necessário compreender o ser humano como unidade integrada, percebendo todas suas facetas e como elas se relacionam. O corpo é o lugar mais importante da existência do indivíduo, é o que faz a pessoa ser no mundo, sentir, se expressar e se relacionar. Há diversos tipos de corpo: físico, etérico, emocional, simbólico, entre outros. A integração desse corpo múltiplo é o que caracteriza a experiência pessoal de cada um (RIOS, 2008).

A imagem corporal é a dinâmica derivada de experiências neurofisiológicas e simbólicas, que se transformam à medida que interagem com o ambiente, propiciando a formação da identidade. Nesse sentido, o campo da psicologia, sobretudo a Junguiana, compreende o corpo como um importante instrumento no processo de individuação (RIOS, 2008).

O corpo funciona como um arquivo de memórias, onde ficam gravadas todas as experiências de vida, conscientes ou inconscientes. Assim, a conscientização do corpo conduz à conscientização da psique, uma vez que no corpo é possível reviver e expressar sensações e emoções de experiências passadas positivas ou negativas, sendo um processo importante para o desenvolvimento e integração dos indivíduos (ZIMMERMANN, 2009).

PETHÖ SÁNDOR, percursor da abordagem corporal no Brasil, acreditava que o processo fisiológico derivado das técnicas de relaxamento corporal agia diretamente na afetividade do indivíduo, alterando as reações da sua personalidade e identificava que o principal resultado obtido com essas técnicas era “além do ‘descanso’, o ‘desatar’ interno, a introspecção e a reprodução construtiva de antigas vivências, atingindo-se assim, novas coordenações e estruturação psicobiológicas” (1982, p. 6).

Diante disso, pode-se considerar o corpo de extrema importância para o desenvolvimento biopsicossocial do indivíduo e um importante aliado no desenvolvimento da resiliência, possibilitando às pessoas uma forma mais saudável de viver em meio a tantas adversidades e exigências inerentes ao mundo moderno.

Conclusão

As diversas referências citadas nesse artigo compreendem o caminho percorrido pelos trabalhadores até o momento atual, em um cenário de grande pressão, tensão e adversidades. Isso ocorre devido ao ambiente competitivo e dinâmico. As transformações nas relações dos profissionais com seu trabalho demandam maior flexibilidade dos sujeitos organizacionais, fazendo com que cada vez mais as organizações exijam de seus colaboradores maior assunção
de risco, criatividade e que estejam engajados e focados na solução de problemas. Essas necessidades criaram demandas relacionadas aos processos psicológicos das pessoas, pois exigem mais responsabilidade, capacidade de inovação, rápida adaptação e autocontrole na rotina de trabalho.

Embora os processos trabalhistas tenham avançado nas últimas décadas, as organizações ainda não possuem preparo e conhecimento suficientes para promover melhores condições de trabalho e qualidade de vida para seus funcionários. Em contrapartida, as pessoas também não aprenderam a lidar com as mudanças aceleradas e exigências inerentes ao ambiente corporativo. Como mostram dados da pesquisa realizada pelo ISMA (International Stress Management Association), com números alarmantes em relação ao estresse decorrente do trabalho. Nesse sentido, o conceito de resiliência, ainda pouco estudado nesse cenário organizacional, pode
contribuir para novos processos de adaptação para as empresas e seus funcionários.

Favorecer a resiliência no ambiente de trabalho, por meio de um olhar holístico e integrado do ser humano, como proposto acima, contribuirá para o processo de autoconhecimento dos trabalhadores, possibilitando a integração do mundo interno e externo e tornando-os mais autoconfiantes, autônomos e autoconscientes, elevando a autoestima, desenvolvendo a competência social e construindo expectativas futuras mais positivas. Assim, será possível promover uma nova cultura organizacional, mais humanizada em seus processos, propiciando um ambiente de trabalho mais saudável, sustentável, produtivo, motivado e com profissionais mais satisfeitos em suas ocupações.

Referências

ARAÚJO, C; MELLO, M.A; RIOS, A.M.G. Resiliência, teoria e práticas de pesquisa em psicologia. São Paulo: Ithaka Books, 2011.

BARRETO, M. Resiliência nas Organizações. In: ARAÚJO, C; MELLO, M.A; RIOS, A.M.G. Resiliência, teoria e práticas de pesquisa em psicologia. São Paulo: Ithaka Books, 2011.

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GORENDER, J. Globalização, tecnologia e relações de trabalho. Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, vol.11 no.29. São Paulo: USP, 1997. Disponível em < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40141997000100017 > Acesso em 06.08.2018.

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